Nessa semana a grande imprensa brasileira publicou estatística segundo a qual, dos 70 processos ligados à lava-jato remetidos para a Justiça Eleitoral, em apenas um deles o réu havia sido julgado e condenado.
As entrelinhas da noticia sugerem uma crítica velada àquela Justiça Especializada, que na verdade não procede. De fato, ela pode ser criticada por modos e tons variados, desde a sua própria existência, até a sua competência constitucional de criar casuísmos eleitorais, a partir da edição de uma inexplicável tábua de regras aplicáveis em cada eleição.
Não se pode, contudo, crismá-la de leniente, porque contra isso a própria realidade se opõe. São inúmeros os casos de cassação de mandatos eleitorais em decorrência de vícios apurados em processos regulares que por ali tramitam. Em Sergipe, muito recentemente, foram cassados os mandatos do atual governador e de um deputado federal, em processos ainda pendentes de recursos, sendo que o parlamentar foi punido por irregularidades constatadas na prestação de contas da sua campanha.
Prestação de contas, aliás, tem se constituído em verdadeiro tormento para os políticos, face o rigor com que o tema é tratado pelos Tribunais Regionais e pelo Superior Eleitoral em cada eleição.
Como sabemos, os processos eleitorais no Brasil ocorrem de 2 em 2 anos para a escolha de membros dos poderes Legislativo e Executivo. Estamos acostumados a conviver, a cada biênio, com regras perenes e com outras sazonais, editadas especificamente para cada pleito, como é da essência do nosso processo eleitoral desde o advento do Código Eleitoral Brasileiro.
Com o advento da Lei Federal 9.504/97 (Lei das Eleições), legislação que tornou perene uma disciplina legal até então pouco consistente, os comitês financeiros e candidatos passaram a ser obrigados a prestar contas com relação aos gastos realizados no pleito eleitoral.
Nesses 22 (vinte e dois) anos de vigência daquela lei, a apresentação da prestação de contas vem evoluindo sensivelmente, sempre no sentido e objetivo de preservar a transparência dos gastos feitos pelos candidatos e partidos políticos e de proporcionar o acompanhamento e fiscalização destes gastos pela Justiça Eleitoral.
Alguns candidatos têm sofrido duros revezes por não fazerem suas equipes atuar de acordo com o figurino legal da contabilidade de contas, de maneira que não é raro inclusive a própria cassação de mandatos conquistados com muita luta, simplesmente porque, analisadas as contas, o TRE constata que não foram prestadas com o rigor que a legislação passou a exigir.
A obrigatoriedade da prestação de contas eleitorais por candidatos aos cargos majoritários e proporcionais está prevista no art. 28 da citada Lei 9.504/97 e o artigo 48 da Resolução nº 23.553/2017 estendeu aquela obrigação aos órgãos partidários de esferas nacionais, estaduais, distritais e municipais, logo após a realização do pleito eleitoral.
Essas contas, ainda segundo a disciplina de regência, poderão ser aprovadas, aprovadas com ressalvas, desaprovadas e declaradas não prestadas.
Quando aprovadas com ressalvas, pela constatação de falhas que não comprometam sua confiabilidade, podem gerar devolução de valores ao erário, principalmente se a despesa efetuada de forma errada teve como fonte de receita fundos públicos.
Podem também ser desaprovadas, quando as falhas observadas comprometerem sua regularidade, hipótese em que outras sanções, além da elementar devolução ao erário, são cabíveis.
E por fim, podem ser declaradas não prestadas, quando os partidos ou candidatos, mesmo após citação da Justiça Eleitoral, permanecerem inertes na apresentação das contas com regularidade e correção. Nesse caso, além da devolução das receitas utilizadas na campanha, o candidato estará impedido de obter certidão de quitação eleitoral até o final da legislatura, persistindo tal efeito até a apresentação das referidas contas.
Com relação aos partidos políticos, a consequência imediata da aprovação com ressalvas será a devolução ao erário de valores que forem declarados irregulares. Já no caso de desaprovação das contas, além da devolução pura e simples, poderá o partido ficar um período sem receber cotas do fundo partidário.
Outra hipótese decorrente da analise da contabilidade de uma campanha eleitoral é a apresentação, por Partido ou Coligação, de fatos e números em desacordo com a Lei 9.504/97, relativamente à arrecadação de recursos, conforme preceitua o art. 30 A. Nesse caso, a consequência mais grave será a não diplomação do candidato eleito ou mesmo a própria cassação do mandato pela Justiça Eleitoral.
As exigências legais em sede de contabilidade eleitoral têm se intensificado e se perenizado a cada pleito, de tal maneira que esse item passou a exigir dos candidatos e seus partidos a criação de setor especializado no assunto, como forma de evitar máculas e revezes dessa ordem.
Por isso mesmo, quem pretende concorrer nas eleições de 2020, deve envidar esforços para contratar, a partir do registro da candidatura, profissionais de contabilidade e de advocacia com experiência na área eleitoral, garantindo a aprovação das suas contas sem ressalvas e assim evitando que elas se tornem elemento de frustração de todo o esforço dispendido durante a campanha.